The Past - Live #1

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Estive a ver umas coisas do passado e decidi fazer um apanhado, até para mim mesmo, dos melhores concertos que já dei, em 6 anos de carreira gloriosos e recheados. Do quê?

Vou, obviamente, correr todos os projectos onde estive, porque todos tiveram pelo menos um concerto marcante.

1. Snow Crackers na Colectividade Vendedores De Jornais - Janeiro 2008

Esta foi o culminar da altura áurea dos Snow Crackers. Tendo gravado um EP no Verão antes, com alguma rodagem em rádios online e sites da cena, e com uma enchente de concertos desde o fim de 2007, este quarto-de-final do II concurso de bandas do SSL (onde chegámos (e de onde saímos) levados em ombros pelo nosso núcleo de amigos - as eliminatórias eram decididas pelo público e nós tinhamos muito e fiel) foi, para nós, um total caos de destruição punk, com (boas) dezenas de vozes a gritarem "ANTICHRIST!" por nós.
Entre muitas hormonas adoloscentes, mosh, crowdsurf (incluindo um meu, de guitarra ligada, no solo de baixo do Alex na Antichrist), stagediving, e outras tantas batatadas e murraças depois, aquela meia hora quase certa soube a uma vida inteira de contestação, de apontar o que está mal e bater-lhe, cuspir-lhe em cima. Tudo de um ponto de vista adoloscente o suficiente para agora, apenas 2 anos depois, conseguir distanciar-me e analisar as coisas dessa maneira. Foi nesse concerto que descobri as maravilhas do feedback, foi nesse concerto que a minha Squier começou a apanhar na boca a sério, e foi nesse concerto que percebi que aquilo, ou isto, é que é vida para mim.

Cuspimos 10 músicas, rápidas e directas e sem merdas pelo meio, com o alinhamento-standard dos Snow Crackers, em que eu começava no baixo e a meio trocava com o Alex.

Tocámos dois covers. O primeiro, estrategicamente metido na nossa alteração de line-up a meio do concerto, foi o refrão da Punx Unite dos Casualities, refrão esse que eles roubaram da If The Kids Are United dos Sham 69.
Tocámos também a Maxwell Murder dos Rancid como "encore" porque desta vez, como muito poucas, pediram-nos mais e tivemos de voltar a subir. O Jójó não tava muito na cena, então juntou-se no moche. O Alex entregou aquele solo de baixo comido na perfeição (como ele me impressionou em 2006!), eu mandei os acordes e o Filete manteve o ritmo frenético de minuto e meio de devastação. Tocámo-la mal, cantámo-la mal (limitámo-nos a gritar "Dial 999!" e assim) e acabámos por matar a sede daquele pessoal todo.

No final do concerto, antes da outra banda entrar, fui buscar uma imperial. Na fila do bar, o João Ribas (sim, o padrasto do punk português, Kú De Judas, Censurados, Tar Perdida..) disse-me para eu guardar a minha senha de banda e pagou-me ele a imperial. Foi uma forma de mostrar apreço, além da conversa que tivemos, e passámos a rodar na rádio online que ele teve com a namorada na altura. Disse que não ia votar em nós, que estava lá para votar nos Empty Bottles (pessoal do melhor, e música punk como até hoje não ouvi mais), mas isso para mim não significava nada.
Na altura, a rebentar e a aparecer, um gajo era mais novo, as opiniões preocupavam-me mais do que agora, que mal me tocam. Apesar dos últimos dois discos dos Tara, não deixa(va) de ser o João Ribas que aí anda(va) há 20 anos.

Foi talvez o concerto que mais me marcou até hoje, apesar de não ter sido o melhor que dei, a nível de alinhamento, de tecnicismo, até de presença (algumas técnicas de que hoje disponho eram na altura embriões), mas foi aquele em que me senti melhor e que fiz crowdsurf de guitarra ligada. E voltei a palco sem pôr os pés no chão.

Nesta tarde vi também outro conecrto que me iria marcar, dos The Hypers, que até hoje se mantêm como uma das bandas que carrega o peso do futuro do rock nacional ás costas.

Depois de um dos melhores concertos que dei, passei a noite com o pessoal por Lisboa, a arruaçar, bastante moralizados. Passámos este quarto-de-final com os Empty Bottles, porque tinhamos crews muito fortes e apoiávamo-nos mutuamente. Curiosamente perdemos esse concurso na meia-final, com os Empty Bottles, numa confusão qualquer que o pessoal fez com os votos que nunca percebi bem, e que até acho que foi o Alex que começou.

#67

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Uma coisa sobre os blogs é que a sabedoria popular regou a semente do boato que são poços de sabedoria infinda, fontes seguras dos conhecimentos desmistificados e dados a conhecer após precisa inspecção cientifica por comptentes engenheiros da informação, especializados para-lá-de-superiormente especificamente em cada área que trabalham.

A PORRA!

Os blogs são, ao invés, o fundo do poço da população emergida na rede, a sujidade, o pó, a lama e a merda de milhões de seres que não vêm nada melhor para servir e dar a conhecer secretamente (a ninguém se não eles) as suas ambições, medos e receios, bem como as ideias e sentimentos que estes impedem de revelar na convivência social.

Há aquele pessoal do "Puto, tenho um blog, vê lá.. Mas não digas a ninguém."

E o meu? O meu é isso mesmo, um mostruário de coisas que acho que não vale a pena ou não merecem ser reveladas, se não mesmo no fundo de um labirinto quase impossivel de se lhe ver um fim, para ficar tudo restringido e sob o meu controlo. Os meus posts não são para vos dar fé (sejam "vos" quem forem) ou ajudar, é antes para eu tirar arquivos em stand-by da minha cabeça.

É também um ambrigo do ataque nuclear mental da operação "Horário Laboral" que todos os dias incide sobre mim.

Chique Esperto Videos 7

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Existem tantas coisas que, não sendo nós nem sendo nossas, precisamos delas como parte complementar e suplementar daquilo que julgamos ter. Falta-nos sempre qualquer pormenor, estamos sempre quase, sempre incompletos. Mas isso é uma coisa boa. Sem o que temos não éramos nada, e com o que passamos a ter queremos sempre mais. Ou não? Este vídeo não tem muito a ver com o que eu disse acima, mas é muito engraçado também. Colhido numa tarde produtiva por Lisboa, esta senhora estava em contacto com o seu mais intimo e poderoso ser, tudo o que não tinha ela tinha ou não tinha porque não lhe intressava naquele momento. Nós, bons parvalhões, só rimos. O Jardim da Estrela parecia, naquela tarde, uma caderneta.



Chique Esperto Videos

A arte de tripar



#65

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Claro que não era ali e fiz meia Avenida de Roma para trás. Amanhã aparece. =)

Chique Esperto Videos 6

segunda-feira, 21 de junho de 2010

O renascer das cinzas.



Chique Esperto Videos

6. A Arte do Chanfano



Fotos.

segunda-feira, 22 de março de 2010

O que é que ia na cabeça do ESTÚPIDO que inventou as máquinas digitais?

FODA-SE!

sábado, 20 de março de 2010





A questão é: "How do you do it?"

Ainda ontem tive a discutir com o meu amigo mais rock n' roll, esse poço de sabedoria, o Luís, e chegámos à conclusão que os Incubus são fruto de um alinhamento estranho qualquer de planetas, que se juntaram por forças superiores.

"Ah e tal mas eles são só um punhado de panisgas bonitinhos com tiques engraçados" - então arranja uma banda e faz melhor.

"How do you do it? Make me feel like I do.."

Chique Esperto Videos 5

domingo, 28 de fevereiro de 2010

Porque de vez em quando um gajo tem de voltar aqui e dar um update. Siga mais um vídeo! Desta feita um bem fofuxo!


Chique Esperto Videos

5. A Arte dos 3 Anos



Chique Esperto Videos 4

domingo, 21 de fevereiro de 2010

ACHAS?
Esses videos não param, bem como o mundo!


Chique Esperto Videos

4. A Arte de Fritar Antes dos Exames




P.s - Atão, censura Zézinho? AHAH tá bem!

Chique Esperto Videos 3

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010



Chique Esperto Videos

3. A arte de indicar o caminho.



Chique Esperto Videos 2

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Pá, eu tou todo abrasédio. Durmi duas ou tres horitas mas acordei pior e desde ontem que hoje ainda não parei.

Este é o segundo video dos CEV, e é bem legal!


Chique Esperto Videos

2. A arte de conduzir com o pé esquerdo.



Chique Esperto Videos 1

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Venho por este meio enunciar a criação de um novo segmento regular no blog: os Chique Esperto Videos, que vão apresentar, em curtos videos, exemplos das mais ricas formas de arte. Aqui vos deixo o primeiro exemplar.

Chique Esperto Videos

1. A arte de fazer playback de Red Hot.


Belém 30.01.10 - Novo lançamento

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010



"Belém 30.01.10" é a minha mais recente criação. Filmado, escrito, dirigido e com performances de Costa, Simões, Eman e Gordo (responsável pela edição), esta curta-metragem retrata uma ida a Belém num Domingo de manhã. Com comédia, acção, suspense, mistério e assim.

Aqui fica o link para o download: http://www.megaupload.com/?d=W0X983KM

Aconselho a todos e todos devem aconselhar aos outros todos.

Surrealismo

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Vi no outro dia que estava a estudar Publicidade que o tipo Freud realçou a influência do nosso subconsciente, mesmo sem sabermos, e que esta influência se prendia com necessidades do foro sexual.. Uma cena assim. Pá, tá bem. Mas isso faz de todos os surrealistas, como o Salvador Dalí, uns ENORMES TARADOS?

Olá outra vez.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Depois desta abstinências de tipo duas semanas sem escrever, eis que volto. Mas também me vou já embora, digo-vos já.

Uma Cor Só Minha (Um Conto)

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

O Marinho vive na Amadora, mais nomeadamente no Casal de São Brás. É a segunda freguesia mais populosa e movimentada do concelho todo. É jovem, e costuma andar pela rua com os amigos, a fazerem barulho com as violas e a apanhar bebedeiras. Mas isto só à noite. De dia, o Marinho apanha o autocarro 137, que passa pelas nove e pouco na paragem à frente da papelaria Librás, até à estação de comboios, põe-se no comboio e vai para Massamá. Lá, trabalha na Óptica Pérola, no Shopping. A caminhada da estação em obras até à óptica é curta, três minutos muito lentos. Estes são os piores três minutos da vida do Marinho e repetem-se todos os dias, excepto aos fins-de-semana e feriados. Não que a óptica esteja fechada ao fim de semana. Está aberta, mas a senhora Dulia e o filho Ricardo tomam conta do negócio e deixam o rapaz preocupar-se com outras coisas. Afinal fim-de-semana é fim-de-semana. Voltando aos três minutos, é naquele segmento repetido de tempo e espaço, dia-a-dia, que a visão do Marinho fica turva e de uma cor. Uma certa cor que só ele viu. Esta cor, que acredita nova, viu-a ele de relance uma vez que se passeava pelo parque de campismo de Almornos, numa manhã húmida de Outuno, aquelas em que nem está a chover nem a bater vento nenhum. As mais frias. Viu essa cor ao virar a cabeça para pegar no telemóvel que lhe parecia ter vibrado, e no centro exacto do seu campo de visão. Mas viu-a só uma vez. Quando voltou a olhar, não estava lá nada, nem um ponto, nem uma linha, nem uma mancha, nem um borrão, nem vestígio nenhum daquela cor misteriosa. E não tinha vibrado, o telemóvel.
Já a tentou descrever aos amigos, mais que muitas vezes, aos do Casal e aos de Massamá, mas nenhum consegue perceber como é a cor que ele viu. Ele próprio não a consegue descrever, porque não é fria, nem quente, não a consegue associar directamente ao Outono e ás condições climatéricas do momento, mas também não consegue prever como ficaria noutros contextos. Não tem nenhum ditongo que o lembre da cor, nenhuma combinação de letras, de palavras, nada lhe vem à cabeça quando pensa na cor. Vê-a apenas como um cortinado de seda fininho, que tinge a sua visão, todas as manhãs, sempre no mesmo sítio. Trabalhando numa óptica fez obviamente um exame à vista, que não revelou nada de anormal. Quando tem tempo livre dá uma olhadela nos livros, nos mapas de cores, nos espectros, mas não descobre nada que lhe seja útil. A ideia daquela cor obviamente que o assusta, mas afogado forçosamente no quotidiano, nunca se deu a trabalhos muito maiores de pesquisa. Não é algo que lhe doa ou que lhe faça comihão, e no fundo nem é assim tão chato.


Outro dia no caminho para a óptica, lá voltou a cor a gritar toda a sua força e a ao mesmo tempo a murmurar a sua indiferença. A cor desapareceu à medida que o Marinho subia as escadas do shopping, vestia a bata, cumprimentava a senhora Dulia, e se preparava para mais um dia normalíssimo de trabalho. Na hora de almoço desse dia, o Ricardo, filho da dona Dulia, convida-o para ir assistir ao ensaio da sua banda, os Jack & Dante. Era terça-feira, e o ensaio era ás oito da noite. Combinaram jantar juntos saíndo da óptica, ás 19 horas, numa churrasqueira a caminho da cave de ensaios. Dito e feito. Quando lá chegaram, o Ricardo apresentou-lhe os outros membros, o baterista Jack e o guitarrista Gordo. O Ricardo era agora o Dante. O Marinho não percebeu de imediato o porquê de toda a gente ali no meio se tratar por alcunhas. Devia ser coisa de estrela rock.
O ensaio começou a desenrolar-se, com feedbacks estridentes e gritos e no meio daquela onda sonora de rock alternativo, como um flash, o Marinho viu a cor, tão óbvia e evidente estampada no bombo da bateria. Fez logo um chinfrim maior que toda a música ali dentro, parou o ensaio e exclamou:
- Ali está a cor! A cor que eu vi!
Incrédulo com todo aquele alarido, o Ricardo apressou-se a perguntar:
- Onde? Mas viste onde?
- No bombo da bateria, meu! – respondeu o Marinho. Mas assim que abriu a boca a cor desapareceu do seu campo visual. Imediatamente, sem mais uma vez deixar rasto ou vestígio. Quando os outros três olharam para o bombo, nada mais viram que o bombo, e a sua pele transparente. Não viram cor nenhuma. Não viram essa cor que era tão opaca para ele mas tão transaparente aos seus olhos.
Como o Jack e o Gordo ainda não estavam bem a par da situação, o Marinho fê-los sentar todos e mais uma vez explicou a sua frágil situação:
-Pessoal, é assim... Eu não sou maluco, de todo. ‘Tava no outro dia a andar pelo parque de campismo que há ali em Almornos e do nada vi uma cor que... Não vos sei explicar. É uma cor que pelos vistos só eu vi, e voltei a ver agora, mas que no mesmo momento que lá estava deixou de estar. Esta cor assombra-me o olhar todas as manhãs que vou trabalhar na óptica do Ricardo, no caminho do comboio até lá, mas depois não a vejo mais. Ou melhor... Agora vi-a!
- Então, mas essa cor é como? Tipo verde, azul, amarelo, uma mistura? – perguntou o Gordo que tocava uns padrões de blues na sua Fender Stratocaster Squier.
- Pá, não te sei explicar...
- ‘Tou a ver... – ironizou Gordo.
O Marinho estava obviamente perturbado. Como é que se explica esta situação a alguém? Como é que se apresentam coerentemente e de modo credível argumentos que susentem um facto a que as pessoas são tão pouco receptivas? E pior: então ele, convidado ali no ensaio, cortou o fio à meada da malha que eles tavam a tocar. Sempre tinha tido aquela ideia de que o pessoal que toca em bandas era todo muito convencido. Mas por outro lado, a partilha de informação é a forma mais fácil de chegar a alguma solução. Alguém podia ter visto a cor em algum lado antes, por alguma razão. Chegaram à conclusão que ninguém tinha visto a cor antes, mas o Gordo mostrou-se bastante intressado nesta questão.
No final do ensaio, ia o Gordo arrumar a sua guitarra na respectiva bolsa – com estampas de bandas punks e reclamações anti-fascistas – que estava ao lado do Marinho e mostrou-lhe os cromos novos que tinha colado na parte de trás da guitarra. O Marinho passeou os olhos pelos cromos e, qual espanto, viu um ponto brilhante.
- Puto, está ali, está ali a cor, a brilhar!
- Onde, onde? – perguntou o Gordo.
- Na cara daquele homem, ali no olho, não vês?
- No Iggy Pop? Népia, não vejo nada.
- É quem?
- O Iggy Pop. Esta é a capa do terceiro disco dele. Chama-se Raw Power e foi produzido pelo Bowie.
Foi tudo o que precisou de saber. Chegando a casa leu tudo o que a internet dizia do disco, até do Iggy Pop, ouviu o disco, olhou para a capa vezes sem conta à procura de uma explicação. Mas o pior, foi que desta vez a cor não apareceu.

Na quinta-feira seguinte voltou ao ensaio deles, desta vez sem nenhum convite formal do Ricardo. Mas o pessoal é assim, quem quiser aparecer é sempre bem vindo. O Gordo voltou mais uma fez a tirar a guitarra da bolsa e o Marinho olhou imediatamente para a parte de trás. Viu o primeiro cromo, dos Beatles, a seguir outro cromo, a capa do Rocket To Russia, o disco dos Ramones, e logo de seguida lá estava o olho do Iggy Pop, naquele cromo de vinil, que lá continuava com o pontinho daquela cor estranha, ao mesmo tempo fascinante e repulsiva. O bombo, por sua vez, durante todo o ensaio, não se camaleou para a cor que o Marinho tanto ansiava ver, mas que só queria evitar. Esta cor continuava, na sua cabeça isenta de definição e de explicação. Foi no final de um cover dos Clash que o Gordo se sentou à sua beira e começou o diálogo:
- Olha meu, fiquei a pensar na tua cena da cor. E se um gajo não se mexer para descobrir isso, nunca vais sair desse impasse. Pesquisei na net, vi uns sites, estudei umas coisas, mas não vi nada de conclusivo.
- Pá, agradeço. – Respondeu o Marinho, com as suas dúvidas sobre o intresse de alguém no seu problema – Acho mesmo que vou aplicar-me a fundo e descobrir o que é isto. E como posso reproduzir esta cor!
Neste momento, juntou-se o Ricardo à conversa:
- Isso é que é falar! Também tive a ver umas coisas e aprendi uma data de cenas. Mais numa noite que num ano a trabalhar numa óptica. É assim: existem três cores primárias, que misturadas originam as cores secundárias. E as cores secundárias misturadas com as primárias originam as cores terciárias. Tinhas-me dito, Marinho, que não conseguias decompor essa cor em nenhumas outras, que não vias ligação absolutamente nenhuma dessa cor com uma outra, certo?
- Sim, sim.
- Então, se não consegues dividir essa cor, decalcá-la noutras, é porque só pode ser outra cor primária!
- Sim, mas como é que ele a vê e mais ninguém vê? – foi deste modo que o Jack cortou o raciocínio brilhante do Ricardo. – Deve ser alguma coisa a nível dos olhos. Vocês é que percebem disso!
- Pá, aparece-me sempre no meio do meu campo de visão. Por isso deve ter alguma coisa a ver com a mobilidade do meu olho, talvez. O olho tem três pares de músculos, tensos e elásticos: os rectos superiores e inferiores, médios e laterais e os oblíquos. Se calhar passa-se alguma coisa... – e aqui, o Marinho foi interrompido pelo Ricardo:
- Mas ainda no outro dia fizeste um exame. Não foi nada muito profundo, mas um problema assim tinha sido detectado.
- Então e o bombo e o Iggy Pop? – o que intressava ao Gordo, acima de tudo, era o rock n’ roll.
- Mostra-lho lá. – Pediu o Jack.
Mal o Gordo virou a guitarra, os olhos do Marinho foram automaticamente atraídos para o olho direito do Iggy Pop. Mas desta vez, não estava lá nada!
- Pá pessoal, não tou a ver nada!
- Desvia isso para o centro do teu campo de visão! – gritou o Ricardo. Isto parecia preocupá-lo tanto quanto ao Marinho.
- Não dá mano, não dá!
Com este episódio ficaram todos ainda mais confusos. Mas concordaram que não iam descansar dali para a frente até encontrarem uma expicação, lógica ou não, para aquilo.
Na Sexta – feira, o dia imediatamente a seguir, a senhora Dulia deu a tarde aos dois rapazes. Nenhum sabia bem porquê, mas veio mesmo a calhar, e aproveitaram para reflectirem juntos sobre a questão da cor que um nunca tinha sequer visto.
Sentaram-se à mesa de um café lá no shopping e reflectiram:
- Vamos pegar no que temos e partir daí. – sugeriu o Ricardo.
- ‘Bora ‘bora.
- Então, a primeira vez que viste a cor foi há quê?
- Foi o há dois meses, para aí. Eu tinha-me levantado cedo, lá para as 9, estava muito frio. E vi-a enquanto passeava, por volta do meio-dia.
- Sim, e mais?
- Pá, vejo-a todos os dias, aqueles três minutos de manhã. E depois foi no bombo e no Iggy Pop.
- Em que música é que viste a cor no bombo?
- Ah, eu não sei pá. Eu sei lá o nome das vossas músicas. Sei que era mais pesada e a bateria mais forte...
- Sim sim, já sei a qual te referes... Antes do refrão tem uma parte em que o Jack bate três vezes no bombo.
E ali, naquele momento da conversa, o Marinho percebeu logo. O Ricardo só percebeu um bocado mais tarde, mas o Marinho encontrou ali a solução:
- Três minutos, três batidas no bombo... O próprio disco, o Raw Power, é o terceiro do Iggy Pop.
- Eish! Tens razão! – agora sim, o Ricardo lá percebeu que tinha a ver com o número três. – Mas então porque é que da outra vez não te apareceu na cara do Iggy Pop?
- Eu, inconscientemente, contava os cromos que ele tem na guitarra. E aquele era sempre o teceiro! Quando foi o primeiro, obviamente que não apareceu nada. – e o Marinho não parou:
- Das nove ao meio-dia são três horas! –o entusiasmo na cara do Marinho pareceu esmorecer de seguida - Mas porquê o número três?
- Então, existem três cores primárias. E três pares de músculos no olho, disseste tu. Se calhar é algum sinal para romperes algum código ou assim uma coisa divina.
- Achas? – isso já parecia exagerado para o Marinho, mas quem sabe...
- É, se calhar não. Deixa lá.
Apressaram-se para casa do Ricardo, onde imprimiram numa folha de papel três fotos exactamente iguais do Ricardo. E, na terceira a que o Marinho deitou os olhos, o chapéu do Ricardo estava daquela cor, agora tão óbvia.
- Então então, ‘tás a ver a cor? – já dizia o Ricardo antes de a folha imprimir.
- ‘Tou ‘tou!
A boa disposição e animação eram gerais. Ligou-se ao Gordo, ligou-se ao Jack, a informá-los que já tinham descoberto o porquê daquela cor. Mas agora havia outro problema: Como reproduzir essa cor? E como reproduzi-la de modo a que as outras pessoas a vejam?
- Vou fazer três borrões de tinta com estes guaches. O terceiro há-de sair com a minha cor. – Tentou o Marinho.
- Mas cada guache tem a sua cor própria. E isso já é muito dificil influenciares, a meu ver...
- O melhor é sempre tentar! – O Marinho estava determinadíssimo!
Borrou o papel com o pincel molhado com tinta magenta uma vez e magenta ficou a nódoa. Depois repetiu o processo com cião, e o papel ganhou aquela cor. Repetiu ainda mais uma vez o processo com o amarelo. E amarelo ficou. Ao olhar para o papel com atenção, pequenos pigmentos da sua cor pareceram começar a brotar das outras cores, como um vulcão em erupção ou um vírus a devorar células, e toda a tinta no papel gahou, para ele, a sua cor.
- Vês? Vês? – perguntou ao Ricardo.
- Não pá. Isso para mim é azul, amarelo e vermelho.
E aí perceberam que aquela cor é só dele.

A cor não ganhou nome, nem significado, mas o Marinho conseguia fazê-la aparecer no seu campo de visão quando quisesse, e ás vezes gostava de ver a vida numa outra tonalidade. Não mais bonita, não mais feia, não mais brilhante ou áspera, opaca ou transparente, escura ou clara, quente ou fria. Apenas mais pessoal. O controlo da cor fez com que ela deixasse de ser uma tormenta e passasse a ser uma espécie de diversão. E, acima de tudo, naquela sexta-feira à tarde, na viagem do comboio e depois na camioneta 26 (chegou antes da 137, e uma pessoa, como é sabido, quer é chegar a casa), ele só pensava como a sua determinação e o seu empenho tinham mudado a sua vida tão drasticamente. À noite, foi para a rua com o pessoal, tocar viola e apanhar uma bebdeira. Mas sempre com a cor debaixo de olho. Essa nunca mais lhe fugiu.

2010

sábado, 2 de janeiro de 2010

2010 começou ás 8h da manhã de dia 31. E ainda não saí de 2009.
 
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